sexta-feira, 27 de junho de 2008

Retrato

Os cigarros acabaram de novo, acabou a coca-cola, está acabando o dia e eu sou forçado a fumar cigarro ruim e pensar na vida à agua. Mas assim são as coisas. Penso que, no fim, não posso reclamar. E de repente, enquanto tudo vai bem no meu mundo de relativa prosperidade, você aparece do nada, do passado guardado com carinho e medo no fundo do armário. Aparece com palavras doces perguntando aquelas coisas perguntadas por velhos amigos, pois é, como vai você, saudades, que tem feito, e a vida, sim, ainda com ela, e você, que bom. E você aparecer assim nem foi tanta surpresa, foi anunciado por aquela música e aquele sentimento desconfortável que aconteceu na semana passada. Nada é a aleatório, afinal, mas tudo tende à incoerência. E o universo não cansa de reinventar sua ironia: esse jeito perverso de oferecer tudo certo na hora errada. Mas se me abala, é coisa pouca. Fiquei velho nesses últimos meses, anos, milênios que passaram sem você, aprendi a lidar com as incongruências estratégicas do dia a dia e aprendi a ignorar o instinto humano de escolher o erro. Aprendi, acima de tudo, a permanecer no caminho certo, a ignorar as divagações sobre certo e errado (inúteis), a ter calma quando acontecem essas coisas assim, digamos, incoerentes, a apreciar o jeito como as coisas têm dado certo. É verdade, realmente: amor não se conjuga no passado. Eu sei que estarei pra sempre em você e você, pra sempre em mim. Mas não é por isso que se tem que andar de novo todos os caminhos já percorridos. Ficou do passado aquela noite de setembro. Mas não o sofrimento, os soluços e lágrimas: o que permanece são as coisas bonitas. E nós seguimos, lições aprendidas, nossos caminhos separados, nossas próprias vidas. Seguimos em frente sabendo: o restante, que é daqui pra frente, será feliz. Disso, não temos duvida.




"Deixa ser como será
Eu vou sem me preocupar.
E crer pra ver o quanto eu posso adivinhar."

domingo, 15 de junho de 2008

As fotos

O que fica pra sempre são as fotos e nelas, o nosso amor. Pretensiosa a idéia de amar para sempre, sim... Mas impossível não, impossível nunca: nada é. Impossível, se algo, é, no máximo, não amar você. Isso sim não consigo imaginar. E apesar do medo de perder, das pequenas brigas e tudo que tem que acontecer, volto ao infeliz clichê: não sei mais, mesmo, viver sem você. Impossível, mesmo, nesse mundo louco, é ter ficado tanto tempo assim, sem uma parte de mim. Felizmente a encontrei.


"There is romance... and there is love."

segunda-feira, 9 de junho de 2008

Crepúsculo

Fechou o livro. Mais um livro e nada. Continuava com o sentimento inquieto, o vazio pungente, a necessidade incômoda de não-sabia-o-que, mas não cansava de procurar. Tinha parado sua vida, vivia dos restos dos restos, não fazia nada se não ler. Não podia deixar de buscar, buscar sempre, eternamente e lia mais e mais livros, nenhum deles dizia nada, palavras que já não faziam sentido, os livros organizados na parede tornavam-se folhas amontoadas pelo chão, pelos cômodos. Andava já cambaleante, arrastava-se pelos quartos entre livros e livros, impossivelmente determinada. Esqueceu seu nome, esqueceu de sua vida, perdeu a chave da porta, não sabia há quantos dias, meses, anos estava entre aquelas paredes e aqueles livros, intermináveis, digeria um atrás do outro sem pausa, talvez estivesse louca mas não pensava mais em si, não perdia seu tempo considerando as fúteis determinantes do ser-normal. Apenas continuava, eternamente, continuava, sempre. Obsessiva na sua busca pelo sentido que faltava, pela palavra ou parágrafo certo, continuava, sem saber: não havia. E naquela tarde de agosto quando pela janela pôde ver os últimos raios de sol fugirem para o outro lado do mundo - conceito já volátil em sua mente - fechou o ultimo livro, depois da ultima palavra lida e chorou suas ultimas lágrimas de desgosto. Morreu sem saber sabe-se lá o que.

domingo, 8 de junho de 2008

Depois, sempre

Depois daquele dia, sua vida mudou. Deitar-se na cama cansado, dia após dia de obrigações e tarefas cumpridas, não era mais recompensador, não como antes. Era estranho, era incompleto. Depois daquele dia, sempre que se deitava sozinho sua cama parecia estar vazia: faltava ela. Depois daquele dia, nunca mais se acostumou, nunca mais deixou de pensar nela em tudo que fazia, depois daquele dia tudo fazia o mais perfeito sentido. Que era certo, que era bonito, que era pra sempre... e mesmo que o tempo passasse, e pensou - vai passar, passa tão rápido - mesmo assim nunca voltaria a ser como antes, a satisfazer-se em viver por si só, viver único. Depois daquele dia confundiu-se nela, perdeu parte de si naquele coração. E não pôde reclamar: se perdeu parte de si naquela outra pessoa, era esse o melhor lugar para deixar-se. Depois daquele dia sua vida continuou, mas diferente: tudo parecia mais leve.